“Os Silvas” podiam ser “Os Melos”, “Os Macedos”, “Os Ramos”.
São uma família que, de um momento para o outro, se vê confinada numa casa por causa de uma doença misteriosa que nos obriga a falar de álcool gel, de máscaras, de distanciamento. Difícil será a quem assista a esta peça não conseguir rever-se em pelo menos uma das situações ou uma das personagens.
Estamos sentados em frente a uma sala como de muitas das nossas casas de infância: o sofá com o naperon, os móveis. As muitas portas para muitas outras divisões, na sua grande maioria que são usadas para dormir. E a sala. O ponto fulcral, o ponto de contacto, o ponto de atrito.
Num texto sagaz escrito por Mário Botequilha vamos rindo como quem se olha ao espelho numa altura em que rir é mesmo o melhor remédio. E enquanto isso vemos cada um daqueles personagens a usar a sua máscara de convivência – porque vai ficar tudo bem – mas mantendo uma pequena penumbra no olhar.
No pai pesado e que se arrasta sem querer pensar na morte do seu próprio pai, na mãe que continua a fazer a sua camisolinha de malha como quem quer enganar as horas. Ao filho que quieto assiste a tudo até ser espicaçado a descobrir-se. A filha, também distribuidora de uma das muitas redes de entregas da cidade. E a tia adormecida numa sanidade mais louca do que uma loucura sã e que acaba por ser a personagem que torna as ligações entre cada um dos outros mais reais.
De salientar ainda a luz e o som que pela sua precisão nos fazem sentir acolhidos naquela sala mais do que simples observadores.
E a pandemia aqui está para ficar mantendo Os Silvas, os Melos, os Macedos, os Ramos mais tempo virados para dentro. Mais tempo virados para si. Numa luta constante entre a revolta desta angústia confinada e a esperança num amanhã de liberdade.
Os Silvas, de Mário Botequilha
26 novembro – 20 dezembro 2020
Teatro Meridional
http://teatromeridional.net/index.php/projecto/historia/espectaculos/335