Se a memória não me atraiçoa, esta é a quarta encenação da peça “A Menina Júlia” a que assisto. As anteriores foram:
- 1999, com Rita Lello e Simão Rubim, numa encenação de Juvenal Garcês
- 2009, com Beatriz Batarda, Albano Jerónimo e Isabel Abreu, numa encenação de Rui Mendes
- 2017, com João Villas-Boas e Teresa Tavares, numa encenação de Daniel Gorjão
Desta feita, a proposta é feita pelo encenador Nuno Nunes, com as interpretações de Anna Knipper, Graciano Amorim e Vera Lagoa. Os actores, recém formados, e para que não acontecesse “nada”, meteram mãos à obra e desafiaram o encenador para este espectáculo. Estreado em Outubro no Teatro do Bairro, teve agora duas apresentações extra na Sociedade Guilherme Cossul.
Este texto do sueco August Strindberg trata dos acontecimentos numa atribulada noite de São João entre Júlia, filha de um conde, João, seu criado, e Cristina, noiva dele. Este triângulo é pois fertil para diversos jogos de poder, que ora pendem para um lado ora para outro, num crescendo de tensão e perigo.
Júlia teve uma educação “moderna” (a peça data de 1888) e usa o seu poder para atrair (será?) João para um jogo perigoso. João deixa-se levar (será?) e, à medida que a alvorada se aproxima, a teia adensa-se a um ponto quase irresolúvel. Cristina, como terceiro lado deste triângulo, tenta ser a voz da razão.
Este é um texto riquíssimo de Strindberg, que aborda as diferenças de classe, misturando-as com o jogo de poder homem/mulher. Este poder vai-se movendo de um lado para o outro ao longo do espectáculo.
A encenação de Nuno Nunes está muito bem conseguida, começando pelo final da trama, e depois saltando para o inicio, para reencontrarmos esse fim, já na sequência certa. A presença de uma televisão em cena, mostrando imagens contemporâneas de programas populares acrescenta um nível de ironia e humor, a que o público não fica indiferente.
Os três actores estão muito seguros nos seus papeis, cada um emprestando a intensidade necessária a cada uma das personagens.
Desafio a quem venha a ver a peça: descobrir a “presença” em cena de figuras públicas portuguesas, homónimas das personagens.
1 e 2 Dezembro 2017
Sociedade Guilherme Cossul
Autoria: August Strindberg
Tradução: Augusto Sobral
Encenação: Nuno Nunes
Interpretação: Anna Knipper, Graciano Amorim, Vera Lagoa
Assistência de cenografia e figurinos: Maria Corte-Real
Vídeo: Paulo Quedas
Fotografia: Nico Scontrino
Apoios: ACT – Escola de Actores, Teatro dos Aloés, Sp Televisão