Em 1991 eu tinha 9 anos. Sonhava ser médica, ou juíza, ou professora ou qualquer uma daquelas coisas que se sonham quando os sonhos estão a uma distância tão grande que parecem apenas sonhos.
Em 1991 o Francisco sonhava, tinha 24 anos e criou uma peça, “O Rei no Exílio”, muito provavelmente sem sonhar onde é que essa peça o ia levar.
Em 2018, no mesmo teatro em que a estreou, Teatro Nacional D. Maria II, o Francisco apresentou o remake dessa obra. Uma obra sonhada, um corpo que cresceu desse sonho, que construiu uma vida ligada à Dança, à cidade de Lisboa. Eu entrei, sentei-me e parecia adormecida por compreender o impacto que um trabalho de uma vida pode ter. Pensei no que sentiria o Francisco ao pisar aquele palco pela primeira vez, o que sentiria ao pisá-lo agora.
Depois fui-me deixando levar – a análise não é fácil, mas necessária: Sabemos que o mundo pula e avança de uma forma cíclica, que é quase como pensar que não saímos do mesmo sítio mas saímos:neste espaço temporal a Dança Contemporânea ganhou relevo, evidência, formaram-se novos artistas e há um respeito neste mundo face a cada um destes Franciscos, criadores de um movimento mas também desbravadores no mundo artístico. O texto surpreende pela atualidade que encerra; pela irreverência, pela sagacidade. O Francisco surpreende por mostrar que parece que nenhum dos 27 anos lhe passou pelo corpo: dono de uma figura atlética pontua a atuação com seriedade e movimentos precisos.
O Rei no Exílio mostrou-nos o fim da nossa monarquia e parece-me que de uma forma certamente irónica, marcou durante a nossa república a ascensão do reinado do Francisco. Tomara a Cultura em Portugal não ser vista como um ramo monárquico e que fosse possível aos nossos reis das artes uma vida fora do exílio. O Francisco, entre um café, um whisky e um par de cigarros bem arrumados entre dedos mostra-nos que a luta está aí e que nada melhor que dançar para o provar.
Venham mais 27!
O Rei no Exílio, de Francisco Camacho
29 de junho 2018
Teatro Nacional D Maria II
Lisboa