As Três Irmãs, de Anton Chekhov, foi o ponto de partida de Christiane Jatahy para “E se elas fossem para Moscou?”. Esta é uma das três peças que a Artista na Cidade 2018 nos apresenta em maio no Teatro Nacional D Maria II. As outras duas são “Julia” (baseada em “Menina Júlia” de August Strindberg) e “A Floresta que Anda” (baseada em “Macbeth” de William Shakespeare).
Voltando a “Moscou”: No dia em que Irina (interpretada por Julia Bernat) comemora 20 anos – e que marca o primeiro aniversário da morte do pai – ela e as irmãs Olga (Isabel Teixeira) e Maria (Stella Rabello) organizam uma festa. Desde o inicio se notam as diferenças entre as três.
Irina, a mais jovem, parece irradiar energia, mas esconde um grave segredo.
Maria, a irmã do meio, casada mas infeliz, pensa na mudança e quase a concretiza.
Olga, a irmã mais velha, conformada, vê a vida com pragmatismo, mas muito humor.
Os desejos das três cruzam-se, mas ao mesmo tempo a inacção impede-as. O querer mudar e o ficar na mesma perpassa o espectáculo. Temas como o envelhecimento físico, o envelhecimento das relações, o desejo de algo mais, o contraste entre o inicio da vida adulta e a maturidade, são temas presentes na peça.
A interpretação das três (grandes) actrizes é de um nível superior, alternando entre o intenso, o comovente e o desconcertante.
O dispositivo de apresentação que Jatahy imaginou é também surpreendente. Diz-se na sinopse, “O desafio é construir duas obras que existem plenamente nos seus territórios, mas que se complementam quando vistas pelo mesmo espectador como uma obra única”. Na prática, o público é separado em dois grupos à entrada do teatro. Metade é levado para um teatro, onde assiste à peça, e a outra metade é levado para uma sala de cinema onde assiste ao filme da peça, realizado em directo. Depois de um intervalo, os públicos trocam de lugar e assistem de novo ao espectáculo, fruindo-o por um novo meio (teatro e depois cinema, ou cinema e depois teatro).
É uma verdadeira descoberta ir percebendo as diferenças entre as duas apresentações do espectáculo, que revela num e no outro meio, detalhes que à primeira vista nos escaparam ou, provavelmente intencionalmente, nos foram ocultados.
Em resumo, esta é uma obra maior da criadora brasileira, que se vê, que depois se revê com outros olhos, e da qual se começa a sentir saudades ainda antes de terminar.
“Mudar é como morrer um pouco”, diz-se no início e no final do espectáculo. Será mesmo?
Entrevista de Christiane Jatahy ao Coffeepaste
E se elas fossem para Moscou?, de Christiane Jatahy
11-13 maio 2018
Teatro Nacional D Maria II
Lisboa
baseado em As três irmãs de Anton Tchekhov
direção e adaptação Christiane Jatahy