“Há uma linha que separa…” podia bem ser o início de um famoso anúncio mas, neste caso, é o início da peça “É pró menino e prá menina”.
Uma linha; meninas para um lado e meninos para outro, como nas histórias da avó e da escola que ainda hoje está de pé. Um tempo em que quem ensinava, quem trabalhava fora de casa eram os homens porque a uma senhora não se pedia nem dela se esperava mais do que ser uma dona de casa. Hoje vemos o diametralmente oposto no ensino: de repente, parece que o estranho é ser um educador masculino, conto pelos dedos de uma mão os professores primários e educadores de infância que conheço.
A linha está lá: de um lado uma menina brinca com a sua boneca, do outro um menino tenta decidir se prefere o camião, a bola ou as luvas de boxe. Cada um do seu lado, como se os mundos não fossem cruzados, como se as vidas fossem linhas paralelas. À menina é recomendado a contenção, brincar com bonecas, sonhar com casamentos de princesa. O menino tem de ser forte, jogar à bola e, se achar graça, casar com uma menina um dia!
Mas, a meio, aparece-nos uma pista: talvez o segredo esteja exactamente aí, em criar pontes, criar caminhos, unir o que pode até ser considerado separado.
Aí, quando as linhas deixam de separar, vemos que o todo muitas vezes é mais do que a soma das partes. Que uma menina não é menos menina por ser Maria rapaz, por ter os joelhos esfolados, por querer uma pista de carros e que um menino é igualmente menino ainda que brinque com bonecas, que não goste de jogar futebol ou que queira ser bailarino.
As linhas vão estar lá sempre – cabe-nos a nós, ontem crianças com vontade própria, hoje adultos educadores permitir que cada um consiga crescer na sua plenitude, seja ela qual for!
Foi isto que vi em palco no São Luiz, vi o meu primo Hélder a vir para minha casa brincar com os meus mil peluches, vi a pista de carrinhos avariada que ele me deu e que montava no quarto da minha avó para que o pai não visse e não ralhasse.
E, quando fechei os olhos um pouco mais, vi escolas com educadores masculinos, mulheres com cargos de gestão, seres completos integrados numa sociedade que os aceita pelo que eles são como pessoas mais do que são como género.
ENCENAÇÃO Catarina Requeijo
INTERPRETAÇÃO João Nunes Monteiro e Marta Cerqueira
CENOGRAFIA E FIGURINOS Maria João Castelo
DESENHO DE LUZ José Álvaro Correia
ASSESSORIA ARTÍSTICA Miguel Fragata
PESQUISA EM CONTEXTO ESCOLAR Catarina Requeijo e Vera Alvelos
PRODUÇÃO Maria João Santos | Uma encomenda São Luiz Teatro Municipal em coprodução com Formiga Atómica Associação Cultural, Centro Cultural Vila Flor, Centro de Arte de Ovar e Cine-Teatro Louletano
É pró menino e prá menina, de Catarina Requeijo
São Luiz Teatro Municipal
17 a 23 de janeiro de 2019